Dilma e a corrupção na Petrobras
Se for possível, esqueça por alguns minutos todos os adjetivos e piadinhas, toda indignação seletiva dos que governaram o país
por
décadas e o transformaram na sociedade mais desigual do planeta, todas
as manchetes escandalosas, esqueça as frases de efeito dos jornalistas
que garantem seus empregos pensando exatamente como o patrão manda, os
comentários dos seus amigos e colegas ressentidos pela ascensão social
dos mais pobres, esqueça por alguns segundos o nosso racismo, nossa
centenária indiferença com os miseráveis, nossa cordial tolerância com
as injustiças sociais, nossa cômoda aceitação da existência de uma
multidão de pobres dispostos a fazer o trabalho pesado por salários
irrisórios, deixe de lado nossa ancestral complacência com a corrupção -
que começa com a carta de Pero Vaz de Caminha pedindo ao Rei um emprego
para um parente e vem até ontem, quando você aceitou pagar menos por um
serviço sem recibo ou ofereceu um troco (ou um milhão) para o fiscal
não lhe multar -, esqueça tudo isso por um breve instante e pense nos
fatos.
1. O golpe
civil-militar de 1964, que jogou o Brasil numa ditadura cruel que durou
25 anos e foi planejado e executado (hoje todos sabem) pelo governo
americano e segundo interesses das grande empresas americanas, foi
apoiado por pessoas de bem como você, que acreditavam no que diziam os
jornais da época (os mesmos de agora), e queriam combater a corrupção na
Petrobras e impedir as práticas comunistas do governo eleito.
2.
Em 1989, ano que marca a volta da democracia com eleições diretas para
presidente, o jornalista Ricardo Boechat foi premiado por denunciar a
corrupção na Petrobras.
3. Em 1995 o jornalista Paulo Francis denunciou a corrupção na Petrobras e, por isso, foi processado.
4. Em 1997, o presidente Fernando Henrique Cardoso acabou com o
monopólio da Petrobras na exploração do petróleo brasileiro e criou o
sistema de concessão, que favoreceu as grande petroleiras americanas.
FHC também editou a Lei n° 9.478, que autorizou a Petrobras a se
submeter ao regime de licitação simplificado, na prática permitindo que a
empresa contratasse fornecedores sem fazer concorrências públicas. Para
o jurista Celso Antônio Bandeira de Mello, esse foi o momento em que "o
governo Fernando Henrique colocou o galinheiro ao cuidado da raposa".
5. Segundo o depoimento dos delatores premiados da Lava Jato (Pedro
Barusco e outros) e segundo a denúncia do Ministério Público, foi em
1997 que esta quadrilha (Paulo Roberto Costa, Youssef e turma) começou a
roubar a Petrobras.
6. Durante o segundo mandato de FHC, o
Ministro da Justiça - e, portanto, chefe da Polícia Federal - era Renan
Calheiros (PMDB).
7. Em 2009, com a descoberta das gigantescas
reservas do pré-sal, o governo Lula anunciou mudanças na lei de
exploração do petróleo, favorecendo a Petrobras. As petroleiras
americanas, Chevron, Shell, Exxon e a inglesa BP, ficaram de fora. Em
telegramas revelados pelo Wikileaks e publicados pela Folha de SP, o
candidato tucano José Serra garantiu aos representantes da Chevron que,
se eleito, voltaria ao sistema anterior. Desde então Serra e o PSDB vem
defendendo o modelo de concessão e os interesses americanos no petróleo
brasileiro.
8. A quadrilha de Youssef e Paulo Roberto Costa
começou a roubar em 1997, roubou a Petrobras durante o segundo mandato
de FHC, durante todo o governo Lula e nos primeiros anos do governo
Dilma. Entre os beneficiados com o esquema milionário estão empresários e
políticos de todos os partidos, especialmente do PP e do PMDB, mas
também do PT, do PSDB, do PSB e outros.
9. Em 2013 Dilma
sancionou a lei 12.846 que definiu como corruptores tanto as pessoas
físicas como as pessoas jurídicas. Graças a esta lei, pelo menos oito
empresas tiveram executivos presos: Camargo Corrêa, Odebrecht, OAS, UTC,
Engevix, Iesa, Queiroz Galvão e Mendes Júnior. A lei sancionada por
Dilma pode render a condenação criminal dos sócios e executivos e pune
as empresas com multas que variam de 0,1% a 20% sobre o seu faturamento.
Foi com este temor que os milionários presos fizeram suas delações
premiadas.
10. Dilma indicou e reconduziu ao cargo o Procurador
Geral Rodrigo Janot, que investiga a corrupção na Petrobras e já
indiciou muitas pessoas. (Bem diferente do que fazia o engavetador geral
da república no governo FHC.)
11. A Polícia Federal, durante o
governo Dilma, levou a cabo a Operação Lava Jato, que prendeu e
desbaratou a quadrilha de Youssef e Eduardo Costa, que roubava a
Petrobras desde o governo de FHC, atravessou o governo Lula roubando e
bateu no poste no governo Dilma. Entre os investigados, com fortes
indícios de terem recebido dinheiro sujo, estão Renan Calheiros
(ministro da Justiça e chefe da Polícia Federal de FHC) e Eduardo Cunha
(PMDB), atual presidente da Câmara, com um longo histórico de
envolvimento em falcatruas de toda espécie.
A corrupção na
Petrobras é antiga, no Brasil é ancestral, e os ladrões de dinheiro
público, de qualquer partido ou governo, devem ser severamente punidos
e, isso é importante, devem devolver o dinheiro que roubaram aos cofres
públicos, mas repassando esta lista de fatos, todos incontestáveis, você
ainda acha que há algum sentido em pedir, com o pretexto de combater a
corrupção na Petrobras, a saída de Dilma para entregar o governo a Renan
Calheiros e a Eduardo Cunha?
Você não acha bem mais provável
que, sob o pretexto de combater a corrupção, eles queiram que a Dilma
saia para atender interesses poderosos e voltar a roubar, como sempre
fizeram?
Jorge Furtado